quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013
Secretário de Saúde paga médico com cheque de Associação e susta documento
Um caso, no mínimo muito estranho, aconteceu em Carmo da Mata, no dia 25 de janeiro: a senhora Cleonice Friaça, de 85 anos, deu entrada na Santa Casa, com problemas cardíacos. Atendida pela equipe de plantão, constatou-se a necessidade de atendimento por especialista em cardiologia, visto que havia suspeita de infarto. A doente foi levada para Oliveira e foi chamado especialista da Clínica Cardioeste para atendê-la. No momento do ocorrido, atendeu o chamado o médico cardiologista Caio Marcus.
Foi constatado o infarto e a necessidade de remoção da paciente para Divinópolis, onde seria submetida a uma angioplastia primária. Devido às condições precárias de saúde, a senhora teve que ser transportada em UTI Móvel. Tudo feito, a senhora foi atendida, feita a cirurgia e a alta estava prevista para quarta-feira, 6 de fevereiro. Porém, os casos ‘estranhos’ começaram a ocorrer aí.
Na hora de acertar as despesas, o secretário de Saúde de Carmo da Mata, Eurides Aleixo Neto, pagou com um cheque da Associação Assistencial Carmo da Mata – conhecida na cidade como Vila Vicentina – entidade que ele preside. Ao apresentar o cheque ao banco, o médico teve a informação de que o mesmo estava sendo devolvido pelo ‘Motivo 21’, que se trata de “contraordem (ou revogação) ou oposição (ou sustação) ao pagamento pelo emitente ou pelo portador”.
O valor do cheque foi de R$360,00 sendo R$250 referentes ao pagamento da consulta e R$110 a taxas cobradas pelo hospital pelos procedimentos executados. Como o secretário teria alegado que só estava com uma folha de cheque, o médico recebeu o valor total e fez o pagamento dos R$110,00 ao hospital.
Por que pagar com cheque da Vila Vicentina?
A explicação para que o cheque fosse sustado, dada à reportagem pelo senhor Eurides foi de “falta de crédito da Vila, já que tínhamos que pagar R$2.100 de utilização de uma UTI Móvel” para transportar a paciente de Oliveira a Divinópolis. Porém, sendo o presidente da entidade, também secretário municipal de Saúde, a pergunta é: por que a Prefeitura não arcou com as despesas, já que existe possibilidade, visto que o Município deveria se responsabilizar pelo atendimento médico aos seus munícipes?
Em resposta à reportagem, Eurides disse que mandou sustar o cheque porque não tinha saldo na conta da Vila Vicentina. Em contato com o banco fomos informados que seria necessário que o recebedor do cheque fosse à agência, portando documentos pessoais e o cheque, para que lhe fosse entregue a declaração formalizada de motivos da sustação. Esta declaração é obrigatória, conforme a legislação que regula a utilização de cheques. O secretário Eurides Aleixo acrescentou, ainda, que “já passei do meu dinheiro cerca de R$5 mil para pagar contas da Vila Vicentina”.
Eurides adiantou também que conversou com “o Ramon”, responsável pelo hospital de Oliveira e que o caso do cheque estaria sendo resolvido. Em Carmo da Mata os comentários são de que o talonário de cheque da Vila Vicentina teria sido usado “para garantir o serviço” e que, “depois, o valor seria pago pela Prefeitura”. Ess as informações não foram confirmadas pela reportagem.
Médico se sentiu humilhado com a atitude do secretário
O médico cardiologista Caio Marcus recebeu a reportagem em seu consultório, em Oliveira, quando contou o ocorrido. Mostrando-se bastante contrariado com a atitude de Eurides, Caio Marcus disse que não foi procurado pelo secretário de Saúde e que, “desde a sexta-feira”, tem tentado contatar Eurides, sem sucesso. Caio Marcus afirmou que “me senti humilhado com a atitude dele. O cheque foi sustado, simplesmente, sem quaisquer explicações”.
Disse o médico que estranhou muito o ocorrido e que nunca teve problemas como este. “Fico feliz em ter podido atender a senhora que, felizmente, está bem (na segunda-feira, 4/2) e deve ter alta na quarta-feira (6/2). Porém, não estou sendo tratado com respeito pelo emitente do cheque. Devolver um cheque por este ter sido sustado... parece que eu fiz alguma coisa errada...”, lamentou.
Incompatibilidade de funções?
A legislação proíbe que dirigentes de órgãos, entidades, instituições ou empresas que transacionam com o poder público, recebendo recursos deste, sejam servidores públicos. No caso do secretário de Saúde, mesmo que não seja ilegal, é no mínimo temeroso que ele dirija uma entidade beneficente, que pode receber recursos públicos, ao mesmo tempo em que ocupa cargo de chefia junto ao Executivo municipal.
Estranho é que um secretário de Saúde, ao saber que uma entidade beneficente não tem recursos para arcar com despesas de uma paciente, emita cheques, mesmo sabendo que não há fundos para cobri-los e que, depois, peça a sustação do mesmo. Estranho, porque deveria saber – até pela natureza do cargo – que o direito ao atendimento médico é garantido aos cidadãos e que o poder público – representado no município pela Prefeitura – é o titular desta responsabilidade.
Com reportagem de Sérgio Cunha
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